“J. S. Bach, o Mestre da Música” (DVD)
(Dedicado ao leitor Moisés Ribeiro, de Brasília, DF)
“Bach é a síntese do passado, a realidade do seu tempo e a profecia do futuro” (Glenn Gould)
Para comemorar, em 1985, o terceiro centenário do nascimento de Johann Sebastian Bach (1685-1750), “JSB, o Mestre da Música”, como filme seriado foi inicialmente exibido na televisão da antiga República Democrática Alemã (RDA – Alemanha Oriental), produzido em cooperação com a televisão húngara. Com dois discos, agora é apresentado no formato DVD.
Por isso, escrevemos que “de 1949 a 1990, a música de Bach recebeu decidido apoio das autoridades e do povo na preservação do seu patrimônio cultural” (OJB, 05 ago 12). Devido ao preconceito ideológico, imposto pela Guerra Fria, este filme chegou ao Brasil com 26 anos de atraso. O único traço da ideologia dominante na época, no leste da Alemanha, é mostrar Bach como um trabalhador, sempre à mercê do patrão, em luta constante com os nobres e os políticos.
Os produtores e diretores cinematográficos do Ocidente não tiveram interesse na vida prosaica de Bach; a exceção, “Crônica de Anna Magdalena Bach” (filme de longa metragem, produzido em 1968 na Itália pelos cineastas franceses Jean-Marie Straub e Daniele Huillet), além de ser baseado numa obra apócrifa, ela- borada por Esther Meynell (OJB, 26 mar 89), é um filme materialista e fisiológico; na tese de Straub e Huillet, a música de Bach é composta de acordo com o espaço onde será ouvida, e será executada graças a um severo treinamento dos dedos; isto contradiz o ideal de Bach: “Dem höchsten Gott allein zu Ehren, dem nächsten draus sich zu belehren” (Ao Deus Altíssimo tudo seja para honrar, e, ao próximo, para instruir).
Vimos “biopics” (filmes biográficos) a respeito de Beethoven, Mozart, Chopin, Schubert, Liszt, Paganini, Wagner e Tschaikowsky, romanceados, mas nenhum retrata a vida pessoal deles com tamanha veracidade, ao mesmo tempo em que reproduz trechos de suas obras com o necessário senso de oportunidade. Neste DVD, a música de Bach é o fio condutor de sua biografia; narra alguns fatos de sua vida.
Primeira parte – “O desafio”
Bach, como organista e servo (1708-1717) do duque da Saxônia, em Weimar compôs muitas obras para órgão. Apresentou-se para competir em Dresden com o organista francês Louis Marchand; é um episódio particularmente instigante e pitoresco; voltando a Weimar, foi preso por três semanas, por causa do capricho do patrão e do contrato draconiano a que estava obrigado.
Segunda parte – “Tu estás comigo”
Como regente orquestral e amigo (1717-1723) do príncipe Leopold, em Köthen, teve anos de felicidade, mas sua primeira esposa Anna Barbara subitamente morreu e a mulher do príncipe, afastando os dois amigos, preferia cavalos e cães de raça. No meio da bonança, o sentimento religioso de Bach foi posto à prova.
Terceira parte – “Tempestade”
Desprestigiado em Köthen, Bach foi procurar emprego em Leipzig. Como diretor musical (1723-1750) das quatro igrejas luteranas da cidade, construiu a sua monumental obra coral. Seu salário reduzido obrigou-o, para ter uma sobrevivência condigna, a tocar em nascimentos, aniversários, casamentos, bodas e enterros. Mas teve o incansável apoio de sua segunda esposa, Anna Magdalena, para cuidar e educar seus muitos filhos.
Quarta parte – “A ordem das estrelas”
As grandes obras instrumentais (“Concertos de Brandemburgo”, “A Arte da Fuga”, “Oferenda Musical”) acompanharam os sucessos das carreiras artísticas de seus filhos e os problemas característicos de seu envelhecimento. É o período mais dramático da vida de Johann Sebastian e Anna Magdalena.
Os minutos da exibição do filme passam prazerosamente, sem prejudicar o rigor histórico, porque os cenários naturais são maravilhosos, os ambientes palacianos suntuosos, a reconstituição de época é bem cuidada, a execução musical (Mat- thias Eisenberg, Hans Otto, Max Pommer,“Berliner Sinfonie Orchester”, “Leipziger Neues Bachisches Collegium Musicum”, “Leipziger Universitätschor”) é excelente e as interpretações do elenco, composto por atores alemães e húngaros, são convincentes, particularmente a de Ulrich Thein (1930-1995), no papel de Johann Sebastian, e a de Franziska Troegner, no de Anna Magdalena. Além de ator, Ulrich Thein era pianista, o que conferiu ao seu desempenho maior credibilidade. Possivelmente, os protagonistas sonharam com o dia em que este filme seria exibido fora da Alemanha.
Lothar Bellag (1930-2001) elaborou o roteiro, talvez baseado na biografia de Bach escrita em 1966 por Karl Geiringer.
O filme, competentemente dirigido por Bellag, nos ajuda a apreciar o gênio de Bach, que realizou a verdadeira poesia musical em honra do Deus Altíssimo.
(Publicado em “O Jornal Batista”, de 03 de março de 2013, p.3)